A
ocupação, que foi batizada “Eliana Silva” em homenagem a uma das maiores lutadoras
pela reforma urbana em Minas Gerais e militante do MLB falecida em 2009, tem
como objetivo conquistar moradia digna e de qualidade para essas famílias,
todas elas de baixa renda (entre zero e um salário e meio) e há anos
cadastradas em programas habitacionais, sem terem, apesar disso, conquistado
até hoje esse direito humano essencial. Atualmente, a cidade de Belo
Horizonte, uma das mais ricas e desenvolvidas do país, possui um déficit
habitacional de mais de 115 mil moradias.
Mal
amanheceu o dia, e o terreno que antes servia como depósito de lixo e rota de
fuga para traficantes da região ganhou vida nos barracos de lona, na cozinha e
na creche comunitária que estavam sendo montadas e nos sonhos das famílias da
ocupação. A polícia também chegou, com seu helicóptero e suas dezenas de
viaturas ainda às 4 da manhã para amedrontar os ocupantes, mas não teve jeito:
a resistência das famílias era grande demais. Nem mesmo o representante da Prefeitura,
que chegou ao local da ocupação exigindo a imediata retirada das famílias
alegando que o terreno ocupado era de propriedade do município e área de
proteção ambiental, foi capaz de demover os homens e mulheres que estavam ali
lutando pelo direito à moradia digna. “Foram nove meses de preparação e espera
para essa ocupação. Não vai ser um helicóptero e meia dúzia de policiais que
vai nos tirar daqui agora”, disse Seu Onofre, uma das lideranças do movimento.
Passadas
as primeiras horas da ocupação, com barracos de lonas ainda sendo levantados,
começaram a chegar inúmeras pessoas da vizinhança, parlamentares,
sindicalistas, representantes de entidades estudantis e movimentos sociais, da
OAB e da Igreja, entre eles o conhecido e respeitado Frei Gilvander, para
prestar solidariedade à ocupação recém-nascida. “Venho aqui para dar apoio a
esse povo sofrido porque ocupar não é crime, crime é não ter onde morar e,
mesmo assim, não ocupar”, disse o Frei durante culto ecumênico realizado na
ocupação. Ainda hoje, todos os dias as famílias recebem visitas de pequenos
comerciantes e de outras famílias vizinhas com doações de alimentos,
ferramentas, água e demais itens necessários para o desenvolvimento da
ocupação, além da concessão voluntária e fraterna dos banheiros de suas casas
para o uso das pessoas que vivem na “Eliana Silva”. Fazem isso pelo simples
fato de que a ocupação deu uma função e utilidade justa àquele terreno,
afastando dali a delinquência que antes dominava a área.
Na
segunda-feira (23/04), como era esperado, a Prefeitura de Belo Horizonte entrou
na Justiça com pedido de reintegração de posse contra as famílias, pedido esse
que foi julgado procedente pelo juiz na tarde da terça-feira (24/04). Essa foi
a saída encontrada pelo prefeito Márcio Lacerda (PSB) para resolver a questão.
Para a prefeitura reprimir famílias sem-teto é melhor do que enfrentar o
déficit habitacional e o modelo capitalista de cidade que vem sendo
adotado há décadas na capital mineira, e que hoje tem como expressão maior o
beneficiamento imoral de grandes empreiteiras e os megaprojetos para a Copa de
2014, resultando no aumento do número de famílias desabrigadas pelas chuvas e
sem casa em Belo Horizonte.
“Vocês vão voltar para o mesmo buraco de que vieram”
Diante
da ameaça de reintegração de posse, o MLB tem feito uma série de movimentos
para evitar a execução da ordem judicial, fortalecido a unidade das famílias e
ampliado a rede de apoio à ocupação. Enquanto isso, as famílias resistem à
pressão e às provocações da polícia, que todas as noites ronda a ocupação,
revista moradores e joga luz no rosto de quem vive na “Eliana Silva”. Viaturas
do tático-móvel circulam o local e fazem ameaças através do megafone do tipo: “Aguardem que a batatinha de vocês está assando.
Vocês vão voltar para o mesmo buraco
que vieram”. Puro fascismo.
As
famílias, entretanto, resistem, pois aprenderam na prática que não há força no
mundo maior do que a força de um povo unido e disposto a vencer. A ocupação
“Eliana Silva” segue firme e forte na certeza de que quem luta, conquista, e de
que só unidos conquistarão o direito humano de morar dignamente. A luta apenas
começou.
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